quarta-feira, 18 de maio de 2011

Inventando Alladim - Neil Gaiman

Hey, pessoas!

Estive levando uns puxões de orelha.

Duas pessoinhas estão reclamando que estou postando pouco.

Enfim, que melhor para pedir desculpas do quê Gaiman?

Lá vai.

Inventando Alladim,
Neil Gaiman

Na cama com ele, aquela noite, como toda noite,
sua irmã a seus pés, ela termina a história,
então espera. Sua irmã rapidamente entende
e diz: - Não consigo dormir. Conta outra, por favor?
Scheherazade inspira nervosamente
e começa: - Na distante Pequim
vivia um jovem preguiçoso com sua mãe.
Seu nome? Alladim. Seu pai tinha morrido...
Ela conta como um mágico sombrio chegou,
dizendo ser seu tio, com um plano:
Levou o garoto para um lugar isolado,
deu-lhe um anel que, disse, o protegeria,
jogou-o numa caverna cheia de pedras preciosas,
-Traga-me a lâmpada! - e quando Alladim se recusou,
na escuridão foi abandonado e sepultado...

Pronto.

Alladim preso debaixo da terra,
ela para, seu marido fisgado por mais uma noite.

No dia seguinte
ela cozinha
alimenta os filhos
e sonha...
Sabendo que Alladim está preso,
e que sua história
só lhe deu mais um dia.
O que acontece agora?
Ela gostaria de saber.

É só quando a noite chega
e seu marido diz, como sempre:
-Amanhã cortarei sua cabeça-,
quando Dunyazade, sua irmã, pergunta: -Mas, por favor,
o que houve com Alladim? - só então ela sabe...

E, numa caverna adornada com joias,
Alladim esfrega sua lâmpada. O Gênio surge.
A história prossegue. Alladim conquista
a princesa e um palácio feito de pérolas.
Vejam só, o mago das trevas está voltando:
-Lâmpadas novas pelas velhas- ele canta pela rua.
E depois que Alladim perde tudo,
ela para.

Ele a deixará viver mais uma noite.

Sua irmã e seu marido adormecem.
Acordada, ela olha a escuridão
Vendo mentalmente as variações:
as maneiras de devolver a Alladim seu mundo,
seu palácio, sua princesa, seu todo.
E então ela adormece. O conto precisa de um final,
mas agora ele se desfaz em sonhos em sua mente.
Ela acorda,
Alimenta os filhos
Penteia o cabelo
Vai ao mercado
Compra um pouco de óleo
O vendedor de óleo o derrama para ela,
decantando-o
de um jarro enorme.
Ela pensa:
E se um homem se escondesse aí?
Ela compra também um pouco de sésamo.

Sua irmã diz: - Ele ainda não matou você.
-Ainda não. - Não dita, a frase espera: - Mas matará.

Na cama, ela lhes conta do anel mágico
que Alladim esfrega. O escravo do Anel aparece...
Mágico morto, Alladim salvo, ela para.
Mas se a história acaba, a narradora morre,
sua única esperança é começar outra.
Scheherazade inspeciona seu armazém de palavras,
ideias e sonhos semiprontos, mal cozidos, combinam-se
com jarros capazes de esconder um homem,
e ela pensa: Abre-te, Sésamo, e sorri.
-Ali Babá era um homem direito,
mas era pobre... - ela começa, e já engrenou,
e assim sua vida é salva por mais uma noite,
até que ela o entedie ou a imaginação falte.

Ela não sabe onde ficam as histórias
antes de serem contadas. (Tampouco eu sei.)
Mas quarenta ladrões soa bem, por isso serão quarenta
ladrões. Ela reza para ter ganhado mais um punhado de dias.

Nós nos salvamos de formas bastante improváveis.


E...

É isso.

Me pergunto se há alguma possibilidade de Scheherazade morrer.
Me pergunto se há alguma possibilidade dela fugir.
Me pergunto se há alguma

Não me pergunto nada.

Pensar sobre o que poderia ter ocorrido, as coisas boas que poderiam ter ocorrido, a felicidade que poderia existir é mais desesperador do que simplesmente encarar a realidade.

domingo, 15 de maio de 2011

Retratos de Desespero - Números 6, 7, 9 e 10, fora o 3

Boa noite.

Não tenho um Scanner aqui.

Não tenho como arranjar um também. Vou direto para a postagem.

"E as pessoas perguntam
será que a Desespero se desespera,
será que o Sonho sonha,
será que o (a) Desejo deseja?

É mais simples que isso.
Ele é Sonho.
Ela(e) é Desejo.
Ela é Desespero.
Tire o desespero e nada sobra.

Nada, exceto um quarto vazio,
e um anzol de tamanho e forma
perfeitos para fisgar seu coração.".



"Seu beijo é o oceano profundo.


Seu beijo não é o oceano profundo.
Seu beijo são os céus cinzentos.


Seu beijo é um beco sem saída.


Seu beijo é seu toque, é sua respiração
é seu dedo, é o que resta
quando os risos se encerram.


Seu beijo é o cão negro que segue você na escuridão.


Existe um cão negro sob os céus cinzentos, pelo
beco sem saída, junto ao oceano profundo.
Não é o beijo dela. Aproxime-se..."

"Não foi o fato de se amarem, ou saberem que nunca poderiam estar juntos,
Não foi o vento no beiral da casa vazia, ou o ruido seco
dos remédios dentro da garrafa de vidro marrom.
Também não foi o gosto amargo com apenas uma caixa velha de vinho tinto para lavá-lo.


Não foi o fato de acordar com ela morta, enquanto você ainda estava vivo.




Foi a maneira como seus dedos tremeram. Fui um gagejar e o jeito de sua lingua
quando tentou falar. Foi o som das sirenes chegando mais perto.
Foi saber que nunca mais você teria outra chance."

"Desespero se lembra.

É uma recordação peculiar e chata,
na qual as coisas se tornam desoladoras e atadas à escuridão.

Existe alegria aqui,
é claro,
e amor,
e carícias.
A presença que faz
o presente ser absolutamente
insuportável.

Sem triunfo,
sem amor,
sem alegria,
o trabalho dela seria em vão."

"Ela decidiu fazer uma lista das coisas que a deixavam feliz.
Ela escreve 'flor da ameixeira' no topo da página.

Então, ela olha fixamente o papel,
incapaz de pensar em algo mais.



Por fim, começa a escurecer."


E eu estou experimentando alguns retratos de Desespero.

Já escureceu também.

Não matei ninguém, porém.


Não que eu saiba.